Quando li o testemunho abaixo do Missionário Anatoliy, muitos sentimentos bombardearam meu coração cristão. O que mais me impactou foi a certeza de misericórdia de Deus para com os soldados russos. Com mais de um ano de guerra, para os ucranianos, os russos são seus inimigos. São pessoas que, se antes compartilhavam aspectos culturais, hoje são os invasores de suas casas e os destruidores do seu país. No entanto, Jesus nos ensinou que a verdadeira diferença é amar aqueles que, do ponto de vista humano, não merecem nosso perdão (Lucas 6:35,36). E Deus, que é maior do que tudo e todos, com sua infinita graça, nos mostra a cada instante que não se trata de nós, mas sim de anunciar a sua Palavra e a sua demonstração de amor —  o sacrifício do seu Filho — , a todos as pessoas da Terra; sejam nossos amigos ou inimigos.

Boa leitura.

Jamile Darlen, jornalista de Missões Mundiais



A misericórdia de Deus

 

Já são 371 dias desde que a Rússia invadiu a Ucrânia. Cerca de 350 mil soldados russos, o equivalente a 85% de todo o exército deles, estão em território ucraniano atacando as nossas cidades. A linha de batalha se estendeu em 1.200km, sendo que 600 km são infernais. Mais de 140 mil soldados russos morreram em batalha, segundo estatística oficial da Ucrânia; enquanto que os russos dizem ser “apenas” 6 mil. Mesmo perdendo a luta, Putin tenta amedrontar e quebrar a nação ucraniana, mas, parece que ninguém o teme mais.

Acabei de levar as crianças para a escola. Agora, não posso trazê-las de volta, pois é proibido durante o acionamento dos alarmes antiaéreos. Da janela do nosso apartamento ouço cinco explosões. Depois descubro que foi o nosso sistema de defesa abatendo mísseis russos. Um deles caiu na parada de ônibus, e por milagre não explodiu. Outro caiu a 500m da casa de um irmão nosso, que tem 10 crianças adotivas. O tamanho do buraco é mais de 25m de largura e 10m de profundidade.

Este cenário apocalíptico pode trazer medo; confesso: ainda sentimos medo. Vivemos neste contexto há mais de um ano. Mas, aprendemos a não viver no pânico. O ser humano tem incrível habilidade de se adaptar. E aprendemos a dividir as responsabilidades. Há quem está na linha do fronte com a arma, defendendo as nossas casas e famílias, e há aqueles que levam ajuda humanitária aos que estão em necessidade. Há outros que servem como capelães; e há ainda outros que se sacrificam para ganhar o dinheiro e ofertar para a defesa do país. Cada um faz a sua parte.

Em fevereiro, passei por uma experiência jamais vivida. Recebemos um telefonema. Foram as autoridades da cidade. Foi dito que em nosso estado há uma prisão reservada para um fim específico. Pelo Pacto de Genebra, os prisioneiros de guerra devem estar num lugar separado. Milhares deles foram transferidos para essa prisão. Depois de uma pausa, disseram que, se quiséssemos, era permitido pregar o Evangelho aos prisioneiros russos. Não acreditei no que ouvi! Dentro de mim surgiu um conflito moral. Por que ir? E se for, que texto bíblico usar? E se pregar, como falar de amor? Será que eles merecem amor depois daquilo que estão fazendo com a nossa nação?! Compartilhei com Iryna, minha esposa, que foi muito radical e disse “não”. E com razão. O trauma causado em nós pelos russos ainda é muito forte. Eles ainda querem nos destruir e não se sabe onde tudo isso vai parar. E se, porventura, algum deles se converter dos seus maus caminhos e se tornar um crente...

Fui até lá em um domingo. Não pude levar telefone ou qualquer aparelho eletrônico; fotos estavam proibidas. Os prisioneiros são protegidos pela lei. Dentro da prisão, passando pelos inúmeros portões, me levaram a um espaço para 70 pessoas, mas trouxeram três grupos, cada um com 70 pessoas. Dentro do quarto havia apenas um militar, dois pastores e centenas de militares. O guarda prosseguiu: “Você tem 1h, fale o que quiser”. 

Trouxe comigo a Bíblia, em papel. Falei, em russo, da parábola do bom samaritano. Contei sobre cinco personagens: o judeu, os ladrões, o sacerdote, o levita e o samaritano. Criando uma imagem de cada personagem, perguntei: “Você se identifica com quem?”. Depois falei de Jesus... No final, fiz apelo. Ao abrir os olhos, vi lágrimas em muitos deles. Não acreditei, pois me senti como o profeta Jonas... Uma hora passou como cinco minutos. O medo já havia passado. Ao me despedir, disse: “Ontem, vocês tomaram a decisão errada. Hoje, têm direito a escolher um rumo diferente. Com Jesus”. 

Até hoje lembro os rostos deles. Oro por eles. Confesso, sem afinidade. Mas, confiando no Senhor. Por favor, ore por nós!

Anatoliy Shmilikhovskyy

Missionário na Ucrânia

 

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